18.12.06

Hotel das estrelas

(para Tam, uma mulher de olhos de amêndoa e botas-coturno).


Eu sei que ultimamente anda usando sandálias rasteiras porque

a vida rasteja e não dá pra ficar em cima do salto por muito

tempo. Por muito tempo em cima do muro,

quando não damos de cara com ele antes mesmo de poder

levantar da cama e escovar os dentes. Os dentes amarelos,

compondo o sorriso meia-boca. Detalhes da direção de arte

deste tempo lento. Embora os anos amontoem-se.

Os sonhos amontoam-se.


Os livros, as roupas, aos montes. Montes de areia.

Olhamos ao redor, e de cara, vemos um cenário entupido

de areia. Um deserto.


Pra onde foi o mar? O rock´n´roll?

Os coturnos amassados no fundo do armário de teias de aranha.

A guitarra penhorada.

As músicas inacabadas. À espera de um desfecho milagroso.

À mercê de um enredo tedioso.

Trocamos as pílulas por drops de hortelã, mas aquele amargo

continua entalado. Aquele hálito de desespero.

E as pessoas, cujos rostos parecem derreter e cujas vozes

soam muito grave ou muito aguda dizendo:

Não se desespere mocinha.

E a gente, prestes a arrancar os cabelos,

respondendo (mentalmente):

mocinha é o caralho, meu nome agora é Maria da Cabrochinha.

Dando-nos conta que se não há baba, não há carrocinha.

Se não há flagrante, não há julgamento.

Se não há confissão, não há penitência.

Rasgamos a sentença, comemos os pedaços e cagamos.


Cagamos meu bem.

Cagamos para o mundo de areia, a vida árida.

Mas cagamos e isso ainda é o que nos atesta vivas.

Lavou, tá novo. Levantemos o quanto antes deste trono

de merda. Do alto deste trono é seco o plano:

a colonização dos ares que nunca respiramos e

a escravização dos desejos que nunca saciamos.

Levantemos em cima das pernas vacilantes, enferrejudas.

Quem sabe, mais cedo ou mais tarde, descobriremos

que tudo não passou de uma prisão de ventre. E,

ainda assim, não desistiremos de uma boa feijoada.


Entre as músicas de Gal que você me gravou,

gravei os seguintes versos:


No fundo do peito este fruto apodrecendo

a cada dentada

...

Mas tenho os olhos tranqüilos de quem sabe

o seu preço.

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13.12.06

os minicontistas


milho ao dente


De grão em grão a galinha enche o papo né?
É não doutô, rindo-se.
Galinha daqui não enche o papo, não avoa, não bota ovo de ouro.
E sério: aqui os galo tem que brigar.


indumentária


Pegou o casaco rasgado, o cabideiro capenga.
Em frente ao espelho, a borda rachada (esquerda? direita?).
O preto absoluto não incomodava.
Não sabia quanto durava o luto, mas resignara-se.

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