26.8.07

Eu não sou Clarice

Lispectorei, expectorei.
Mas o muco aderiu-se.
Às paredes de minhas palavras.
Tais letras revestidas de gosma.
Não são mais minhas. Nem de ninguém.

Chorei. E depois dobrei.
Pagando o dobro, riu-se.
Ela riu-se de mim, entusiasmada.
Entusiasmo de jogo, de aposta.
A aposta não era minha. Nem de ninguém.

Notei. E antes anotei.
Tomando pílulas, previniu-se.
Ela previniu-se da vida, mumificada.
Imóvel, tendo ao nariz uma mosca.
O nariz não era meu, nem de ninguém.

Viajei, surtei.
Mas a liberdade exauriu-se.
De dar bengala às minhas mancadas.
Ela não suporta quem se encosta.
O suporte não era meu. Nem de ninguém.

Ninguém tem liberdade.
A liberdade é de ninguém.
Ninguém pode ser Clarice.
Eu não posso ser Clarice.




passado, pelas 18:37

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