18.12.10

Macaúba e Mescalina

Se veio querendo conto
Não serei eu a dizer
Pois nem saberia como

Se veio querendo rima
Eu mal poderei dizer
Metade do que gostaria

Se veio querendo humor
O que deverei dizer
É no mínimo constrangedor

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3.12.10

ela, eu e as horas

acordamos
ou, ao menos,
abrimos os olhos aos poucos

você tenta reconhecer o que há ao seu redor
nem sempre consegue foco e a luz aparece pálida na retina
seu espelho é o primeiro chamado - mãe
ao seu lado, me envolvo na coberta
respondo como se sua mãe fosse
respiro os últimos segundos do sono
desejava que pudéssemos sonhar mais tempo
juntas

cambaleio
e vou decifrar seus matinais
na falta de dicionário para essa nova língua
recolho as imagens incertas na cama
muitas vezes, estão demasiado incertas
despertando sua compaixão
por minha tanta insciência
- é que hoje, eu sei, não é ontem
mas será certamente amanhã

preparo o desjejum
e as linhas do seu rosto esboçam um sorriso
consigo ver a boca alegre que você carregava
e aquelas narinas muito atentas
das quais herdei um senso incomum para odores
e ficamos ali, devorando o tempo
até que ele se cansa de nós
e você pede que voltemos
para o refúgio dos dias
lá onde você descansa
do mundo pesado que leva sob os pés

é quando me perco
entre os cômodos do casaréu
um talher, um copo, um colchão
dois maracujás novos
e um bocado de açúcar
outra vez bato à porta da sua vigília
sem perceber que se divertia
conversando com tantas pessoas
ou imersa
no rio onírico tão real
esses minutos em que mergulha
outra vez em si

é que preciso que beba algo
coma isso, vire para cá
olhe para mim, não fale assim
eu não sei tirar tantas pedras daqui
a mesa nos espera
e nos espera agora
quem saberá que horas são?
o dia passou inteiro?
a tarde se esvai ou o sol se esquece de desaparecer?
tanto faz
seu tempo é diverso de qualquer outro
é o de quando éramos as suas pequeninas
na barriga ou pelo corredor
e de tanto ouvi-la perguntar pelas crianças
acabo por me sentir uma
a que custou aprender
que o carinho, ele invertido,
não preserva o nome
mas se veste de um sentido
o da a ventura de ter tido
sem saber
o único abrigo do mundo.

passado, pelas 23:15 2 comentários

1.12.10

half dreaming

um poema que não pode ser sobre amor
está escrito em algum lugar
aquele que nada diz
senão sobre o que flutua
que se perde no anseio
e mergulha no tempo
por mero querer saber

esse poema seria
talvez sobre o esquecimento
muito mais o de si
do que o dos gestos
daquilo que ousam chamar de história
por isso não o nomeiam épico
e a ele devotam nenhum palanque
no alto de suas verves prosaicas

eu, decerto, jamais o li
e quem ouvi recitar
um ou dois dos seus versos
tampouco o sabia completo
guardei, contudo, a sensação das frases
o som de algumas palavras
e pude imaginar outras
lembrando, sempre
que não se irradiavam
de paixão que fosse
e, sim, de um estado mais cru
de um ímpeto terno
e fatal
um estado de cura anterior
o que arranca o coração do corpo

não como quem se torna ileso da perda
apenas para devolver-lhe a pureza.

passado, pelas 19:33 2 comentários

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